Decomposição
No princípio era Jean Genet e foi “Nossa Senhora das Flores” e “Diário de um ladrão”e foi toda uma procura num sentido descendente mas numa tentativa de alcançar a elevação, a ascensão, era consumir e deixar-se consumir totalmente para rebentar e desaparecer nessa demasia e isso seria um acto poético bonito, vivencialmente doloroso mas a única via de esvaziamento, que permitiria essa levitação ansiada… mas falhou… com toda a mágoa, ter-me-á faltado coragem para me deixar rebentar, para bater no fundo e apanhar o ressalto, mas sem esperar pelo ressalto, sem saber sequer se o ressalto existiria… e nesse ressalto, sem qualquer premeditação ou esperança, deixar que as asas me crescessem e aceitá-las… ter-me-á faltado a disciplina e a coragem de me deixar cair… DECOMPOSIÇÃO é, talvez por isso e apenas, mais um manifesto mediano sobre a solidão e a impossibilidade das relações… um cerimonial do vazio ou um cerimonial de alguém que talvez tente atrozmente fugir do vazio… há um espaço circunscrito e vedado… um falso exílio (es)forçado… há uma trindade constante e flutuante… 3 corpos, 3 cadeiras, 3 corpos vazios, 3 cadeiras vazias… e toda uma cosmética para se chegar ou disfarçar (a) o vazio… é o querer a plenitude seja ela qual for… é não estar bem assim e querer transformar-se… é o transformar-se e não alcançar a satisfação… é estar lá a negritude não verdadeiramente alcançada… é estar lá a claridade mas não a alcançar… e nessa medianidade, a insatisfação… o que lá estará afinal será sobretudo ausência… Uma liturgia funesta do amor…? uma celebração da finitude… uma recusa da finitude… um recomeço… um reinício… um início… mas será sempre assim? uma decadência acontecida, pressentida, antecedida … quantas vezes afinal poderá amar um coração? Est ce que c’est la mort où la petit mort? Um corpo a falhar… gasto… insuficiente… mais um corpo perdido que perdeu outros… mais um corpo a decompor-se… a decompor-se porque se quer afirmar… e, no meio dos estilhaços um pairar constante na linha média com ligeiras oscilações acima e a baixo… e esta medianidade atormenta… mói… decompõe… Premiered on the 18th November 2009 Teatro Aveirense, Aveiro, Portugal |
Credits:
Conceito, direcção artística, dramaturgia, concepção plástica e videográfica, figurinos: Helena Botto Composição musical original e sonoplastia: João Figueiredo Captação de imagem, edição e videoplastia: Cláudio Oliveira Desenho e operação de luz: Pedro Fonseca Performers e co-criadores: Cláudio Oliveira, Helena Botto e João Figueiredo Performers no vídeo: David Q, Helena Botto e Ludger Lamers Brainstorming inicial: André de Brito Correia Colaboração Artística: Ludger Lamers Costureira: Maria Adelaide Uma produção Projecto Transparências – criação de objectos performativos – associação Agradecimentos: António Costa Valente, António Reis, Daniel Duarte Moreira, Emanuel Pina, Jorge Fardilha, Rui Raposo (e toda a equipa técnica do Teatro Aveirense), Maria Odete Reis, O Manequim – tecidos exclusivos e um agradecimento muito especial a André de Brito Correia Apoios: Teatro Aveirense e Instituto Português da Juventude |